Iglesias anuncia fim de era para o Podemos, com menos 'sex appeal'
"Não somos mais 'outsiders'", decretou Iglesias. "Pode ser que ganhemos as eleições em quatro anos ou que levemos uma surra de proporções bíblicas", disse o candidato derrotado a premiê, em conferência promovida pela Universidade Complutense de Madri, de onde saiu o núcleo fundador do Podemos.
David Fernández/Xinhua | ||
Líder do Podemos, Pablo Iglesias, na capital espanhola, no fim do mês passado |
Iglesias, como a maioria desse núcleo, é cientista político, e foi nessa capacidade, também, que analisou os desafios diante do Podemos, partido criado há dois anos e meio.
Para Iglesias, as eleições do último dia 26, quando o Podemos teve 1 milhão de votos a menos do que esperava alcançar após fechar coligação com Esquerda Unida, "fecharam uma época política na Espanha".
Em outubro de 2014, na primeira grande assembleia do Podemos, em Madri, Iglesias havia anunciado que "o céu se toma por assalto, não por consenso".
Posteriormente, em maio de 2015, o líder e ideólogo do Podemos afirmou, em artigo na "The New Left Review" intitulado "Entendendo o Podemos", que a Espanha vivia uma janela de oportunidade única para a ascensão de um partido como o Podemos.
Depois da decepção, Iglesias anuncia agora que é o momento de abandonar a guerrilha e entrar em uma guerra de posições.
"Entramos em uma fase em que temos que nos converter em um partido normal, e isso tem enormes riscos", disse Iglesias, que agora vai liderar uma bancada de 71 deputados, a terceira maior da Câmara de Deputados, atrás apenas das do PP (Partido Popular, conservador) e do PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol, social-democrata).
"Esse desafio me impressiona, me assombra, inclusive, porque passar a ser um exército regular não vai ser fácil, e ninguém garante que vamos nos sair bem", reconheceu Iglesias.
Para o líder do Podemos, o trabalho parlamentar "pode ser maravilhoso ou pode ser o caminho para o cretinismo político".
"Conseguimos sobreviver graças ao fato de que tínhamos 'sex appeal'. Nossa capacidade de mantê-lo diminuiu", disse.
Iglesias estava acompanhado de seu coordenador de campanha, Iñigo Errejón, um dos principais nomes da cúpula do partido, e de Luis Alegre, cofundador do Podemos.
"Não está excluída a possibilidade de que o Podemos governe a Espanha, mas será outro Podemos, outra coisa. Mais previsível, menos sexy, e que gere menos medo e menos incerteza", afirmou Errejón.
AVALIAÇÃO
O Podemos contratou uma pesquisa de opinião para tentar entender os resultados eleitorais, depois que todas as pesquisas de intenção de voto realizadas antes do pleito indicavam que o partido chegaria em segundo lugar, à frente do PSOE.
O resultado oficial, no entanto, deixou o Podemos com 14 deputados menos que o rival no campo da esquerda: o PSOE elegeu 85 deputados.
Para a cúpula do Podemos, o medo de que o partido chegasse ao poder, agravado pelas incertezas geradas pela saída do Reino Unido da União Europeia (Brexit), levou muitos possíveis eleitores a se absterem. O Brexit foi anunciado 48 horas antes da abertura das urnas na Espanha.
No programa "Fort Apache", do qual é apresentador, Iglesias disse que o Podemos é um partido visto com simpatia por botar os grandes partidos "em apuros". "Mas essa gente não votaria em nós se nos visse como possíveis ganhadores".
Segundo a interpretação de Iglesias, o reconhecimento de que o Podemos somente poderá governar na Espanha em aliança com o PSOE marca "um antes e um depois" na história do partido.
Para fazer aliança não só com o PSOE mas com os partidos social-democratas da França, da Itália e de Portugal, será preciso defender uma plataforma "pouco erótica, mas viável", afirmou Iglesias no programa.
Acabou, segundo ele, a época em que o Podemos podia ser dar ao luxo de "impugnar" a atuação dos partidos tradicionais.
"Isso [a necessidade de alianças] impede essa impugnação populista maravilhosa que podíamos nos permitir nas eleições europeias [de 2014], quando nosso objetivo era abrir espaço", concluiu Iglesias.
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