5 de septiembre de 2016
Apoio à democracia cai na América Latina com economia fraca e corrupção
Apoio à democracia cai na América Latina com
economia fraca e corrupção
Brasil lidera a
queda no apoio ao regime democrático: passou de 54% em 2015 para 32% neste ano.
País é o que tem a menor taxa de confiança entre as pessoas
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EL PAIS - Buenos Aires 4 SET 2016 - 19:13 CEST
Manifestantes contra e a favor do
impeachment, em São Paulo (à esq.) e em Brasília. FERNANDO BIZERRA JR. / SEBASTIÃO MOREIRA EFE
A crise econômica, os
escândalos de corrupção e a insatisfação com os serviços públicos estão fazendo
estragos na opinião que os latino-americanos têm da democracia, um regime que
se consolidou em quase toda a região, mas cujo exercício não consegue
satisfazer os cidadãos. De acordo com o Latinobarómetro –um prestigioso estudo regional que está completando 20
anose analisa 20.000 pesquisas realizadas nos 18 principais países
da América Latina–, o apoio à democracia caiu novamente em 2016. O respaldo
passou de 56% para 54%. E o que é mais grave, cresceu a porcentagem daqueles
que respondem ser “indiferentes” se há um regime democrático ou não, passando
de 20% para 23%. É o máximo de indiferentes nos 21 anos do Latinobarómetro. Em
14 dos 18 países pesquisados a popularidade dos Governos está abaixo dos 50%.
O Brasil lidera o pessimismo com a democracia: o apoio a esta forma de
poder diminuiu 22 pontos porcentuais no país, passando de 54% em 2015 para 32%
neste ano. Numa lista de 18 países, o Brasil é o segundo país mais pessimista,
à frente apenas da Guatemala (30%). O Brasil só havia atingido uma marca tão
baixa em 2001, quando chegou a 30%. Foi um ano de economia fraca e do apagão
nacional de energia, que tirou o humor dos brasileiros. Agora, a crise política
e os escândalos de corrupção podem explicar o desânimo nacional. Esse contexto
explica também outro indicador da pesquisa: o Brasil é o país com menos
confiança interpessoal do continente, com meros 3%, enquanto a média do
continente é de 17%. “Nunca havia sido registrado um país sem confiança
interpessoal desde que esta série começou a ser medida [em 1995]. Sem dúvida, a
crise política que o Brasil vive é um dos fatores que explica esse dado”, diz o
relatório.
Nas entrevistas, a pergunta feita aos participantes é: Você acredita que
é possível confiar na maioria das pessoas ou que a gente nunca é
suficientemente cuidadoso no trato com os demais?
O Chile é outro país que registrou uma queda significativa no apoio à
democracia, passando de 65% para 54%, um recuo de 11 pontos porcentuais,
seguido por Uruguai (-8 pontos porcentuais), Venezuela e Nicarágua (-7) e El
Salvador (-5).
O único dado positivo da pesquisa Latino barómetro é que não cresceram,
mas diminuíram ligeiramente, os que apoiam um “regime autoritário”, que
passaram de 16% para 15%.
Este é o quarto ano consecutivo que, apesar dos teóricos avanços e da
chegada de novas gerações que nasceram na democracia, o apoio a esse regime não
melhora. “O apoio à democracia na América Latina tem três pontos baixos nestes 21 anos
que o Latino barómetro mede esse indicador: a crise asiática em 2001, quando
atingiu 48%, e em 2007 e 2016 com 54%”, explicam as conclusões. Pode-se dizer
que “o paciente está em estado delicado, com algumas recaídas”, insiste a
análise.
Os autores do estudo, dirigido pela chilena Marta Lagos, interrogam
sobre as causas e encontram algumas nos dados analisados. “Depois de 21 anos
monitorando o apoio à democracia, a
situação é pior do que no início. O que aconteceu com a região, além de entrar
num período de baixo ou nenhum crescimento econômico? Será que o ciclo
econômico impede o avanço do processo de consolidação da democracia? Os dados
sugerem algo diferente porque o apoio à democracia aumentou durante a crise do subprime em 2008 e 2009, quando a economia estava indo na direção oposta e
atingiu um pico em 2010, com 61%. Só a partir de 2010 aconteceu uma queda, o
que indicaria que a economia não é o único fator que influi”, apontam.
O estudo procura outra origem da insatisfação: “É possível argumentar
como explicação que, enquanto as desigualdades não forem eliminadas não se
conseguirá essa consolidação. Os êxitos de Equador e Bolívia podem ser
interpretados nesse sentido. É possível avançar bastante em termos de mudanças
normativas, inclusão e progresso econômico, mas esse processo parece ter um
teto em termos de extinção das desigualdades”.
Há um dado muito claro. “Entre 2004 e 2011 aumentou de 24% para 36% a
percepção de que se governa para todo o povo, mas, desde então, esse indicador
veio caindo até atingir apenas 22% em 2016, o número mais baixo em 12 anos. No
Brasil, Paraguai e Chile apenas 9% e 10% acreditam que se governa para todas as
pessoas. Em 2016 chegam a um máximo de 73% os cidadãos da região que acreditam
que se governa em benefício de alguns grupos poderosos. Esse indicador é de 88%
no Paraguai, 87% no Brasil e no Chile, 86% na Costa Rica, 84% no Peru, 82% na
Colômbia e 80% no Panamá”.
O Latino barómetro analisou a situação país por país. E detectou que
nenhum presidente é forte na região, o que condiz com a queda do nível de apoio
à democracia e com essa decepção generalizada. “Poderíamos dizer que nenhum
presidente latino-americano conta hoje com capital político acumulado para
gastar. Em 2009, havia 6 presidentes com mais de 70% de aprovação e apenas 2
com menos de um terço. Hoje, em média, desde 2010 a aprovação dos governos da
região caiu de 60% para 38%, uma perda de 22 pontos percentuais. A aprovação ao
governo em 2016 é mais parecida com a de 2002 e 2003, quando a América Latina
estava saindo da crise asiática”, explica.
Na análise dos dados conclui-se que a sociedade mudou. “O que era
tolerável 5 anos atrás, hoje não é. As pessoas aspiram, principalmente, a que
haja soluções concretas para problemas concretos e que sejam aplicadas
imediatamente porque não estão dispostas a esperar as soluções prometidas para
depois de amanhã”.
Uma prova de que a democracia tem problemas na região é que muitos
latino-americanos aceitam algum grau de autoritarismo. Por exemplo, “um terço
da região (30%) afirma que está certo que o presidente controle os meios de
comunicação em caso de dificuldades”. “Novamente é nos países da América
Central onde existe maior apoio a essa afirmação, como na Guatemala (51%), e
novamente é o Chile o país onde há menos adesão a isso (17%)”, conclui. Outro
item na mesma linha é o apoio à “mão pesada” contra a liberdade. Mas existem
muitas diferenças. Em países como a República Dominicana, 82% das pessoas apoia
a mão pesada, enquanto no Brasil cai para 42%.
A insatisfação também é explicada em parte pela lista dos principais
problemas. O crime é considerado o problema mais importante por 22% dos
latino-americanos, mas se os problemas de natureza econômica forem
acrescentados fica ligeiramente acima como primeiro problema. Mas há muitos
países onde a insegurança é o principal problema: Honduras, Panamá, Guatemala,
República Dominicana, Chile, México, Colômbia, Peru, El Salvador e Uruguai. No
Brasil, pelo contrário, a saúde é a principal preocupação; para os
bolivianos é a corrupção e para os argentinos é o estado geral da economia.
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