2 de septiembre de 2012
A Ásia e a estratégia de defesa dos EUA
A Ásia e a estratégia de
defesa dos EUA
28 de agosto
de 2012 | 3h 06
O ESTADO DE SÃO
PAULO - Rubens Barbosa
Os EUA
promoveram no início de 2012 a mais profunda mudança estratégica na sua
política externa e de defesa desde 2002, quando George W. Bush, sob o impacto
do atentado de 11 de setembro de 2001, radicalizou a ação americana no
exterior. A redução do déficit público, a nova concepção da estratégia militar
baseada mais nos avanços tecnológicos e a emergência da China aceleraram a
decisão de Barack Obama.
A ação
da Casa Branca pode ser vista também como o reconhecimento das grandes
transformações por que passa o cenário internacional: a perda da importância
relativa da Europa do ponto de vista econômico e de defesa pela ausência de
ameaças de segurança, os efeitos da crise econômica sobre as economias
americana e europeia e a crescente importância econômica da Ásia.
O
governo dos EUA, com as novas diretrizes, procura defender seu interesse,
coerente com a Estratégia de Segurança Nacional, de 2002. Numa das passagens
mais cruas do unilateralismo então vigente, o documento afirmava que "os
EUA serão suficientemente fortes para dissuadir potenciais adversários de
buscar um fortalecimento militar, com a expectativa de ultrapassar ou igualar o
poder" americano. A Estratégia de Segurança Nacional, atualizada
recentemente por Obama, na mesma linha, visa "aqueles que buscam impedir a
projeção de poder dos EUA" e reconhece que, "a longo prazo, a
emergência da China como uma potência regional poderá afetar a economia e a
segurança dos EUA de diversas formas. O crescimento do poderio militar chinês,
contudo, deve ser acompanhado de maior clareza quanto às suas intenções
estratégicas a fim de evitar a ocorrência de fricções na região".
A nova
política, a ser desdobrada nos próximos anos, aponta para um corte substancial
no orçamento de defesa e traz a reorientação estratégica voltada para o futuro.
O redesenho das Forças Armadas presume que guerras com grande mobilização de
tropas terrestres não voltarão a repetir-se e, em consequência, serão
reduzidas, de forma significativa, as ações do Exército e da Infantaria Naval.
O tipo de guerra que se desenha para o futuro será determinado por ações
secretas, respaldadas por informações da inteligência e por veículos não
tripulados (drones), e pela guerra cibernética, como ocorreu no Irã, com ações
secretas e a sucessão de mortes de cientistas nucleares que afetaram o programa
e as instalações nucleares.
Ao
reafirmar o poder global americano, no State of the Union em janeiro -
"quem diz que os EUA estão em declínio, não sabe do que está falando"
-, Obama responde à percepção de que o poderio da China está aumentando
perigosamente e necessita ser contrabalançado pelos EUA. O CSIS, think tank de
Washington, por solicitação do Pentágono, recomendou a transferência de forças
do Nordeste da Ásia para o Mar do Sul da China, o aumento do número de
submarinos na base de Guam e o posicionamento de porta-aviões na Austrália.
As
primeiras manifestações dessa mudança estratégica foram o anúncio do
estabelecimento de uma base permanente na Austrália, o envio de 2.500
fuzileiros navais para ajudarem a manter a segurança da região, o deslocamento
de 60% da força naval para o Pacífico até 2020, a aproximação com Mianmar e a
ampliada cooperação naval com a Índia e o Japão. A saída total do Iraque,
depois do fracasso militar e da reconstrução, e a redução de efetivos militares
na Europa completam as medidas iniciais.
Embora
os movimentos populares árabes, a crise Israel-Palestina e o programa nuclear
iraniano continuem a manter os EUA envolvidos no Oriente Médio, a nova política
prevê o "reequilíbrio voltado para a Ásia-Pacífico e o apoio à Índia, como
âncora econômica e um elemento de segurança para toda a região do Oceano
Índico". A estratégia visa a aumentar a presença americana na Ásia e a
contrapor o poderio chinês do ponto de vista de defesa, econômico e comercial.
A
China, a segunda economia global, amplia seu alcance militar e econômico na
região Indo-Pacífica, podendo levar à criação de bloco sinocêntrico, dominando
o Pacífico Ocidental. Pelo Mar do Sul da China, declarado de interesse nacional
dos EUA, passa um terço do comércio mundial, mais de US$ 5,3 trilhões. A região
abriga reservas inexploradas de gás e petróleo e é foco de longas disputas
territoriais da China, sobretudo com as Filipinas, o Vietnã e, em especial,
Taiwan.
Apesar
de a forte reação negativa chinesa ter-se manifestado em declarações públicas
do governo de Pequim, os dois países estabeleceram um diálogo estratégico e de
defesa de alto nível.
Obama
aproveitou a abertura da reunião da Associação das Nações do Sudeste Asiático
(Asean) e o encontro de cúpula dos países do Fórum de Cooperação Econômica
Ásia-Pacífico (Apec) para divulgar o redesenho da estratégia para a região. Na
Apec o presidente americano anunciou a negociação de acordo de livre-comércio
entre os países-membros da Parceria Trans-Pacífico (PTP), sem a participação da
China, "por não atuar conforme as regras do comércio internacional".
Há, do
ponto de vista de Washington, uma clara rationale para o aumento da presença
militar e econômica na Ásia, o que, numa visão de médio e longo prazos, está
muito mais de acordo com o interesse nacional americano do que a manutenção das
guerras no Oriente Médio.
É
prematuro afirmar que os primeiros passos dessa nova estratégia possam levar a
uma confrontação entre EUA e China, propiciando o surgimento de algo semelhante
à guerra fria, que pôs em campos opostos os EUA e a URSS. O que se pode
afirmar, contudo, é que uma nova área de tensão surgiu no já conturbado cenário
internacional e que, para os EUA, vai ser mais difícil gerenciar a aliança
asiática do que administrar a relação com a Organização do Tratado do Atlântico
Norte (Otan).
* FOI EMBAIXADOR EM WASHINGTON (1999-200)
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