20 de junio de 2012

Fora de Foco


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O GLOBO

Na coluna ‘Volta ao mundo’, Helena Celestino descreve trapalhadas de Mariano Rajoy na condução da crise espanhola

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Presidente do governo espanhol foi criticado por papel no regaste dos bancos do país
Foto: Daniel Ochoa de Olza / AP
Presidente do governo espanhol foi criticado por papel no regaste dos bancos do paísDANIEL OCHOA DE OLZA / AP
LONDRES — Foi devastador o efeito político do pacote de resgaste à Espanha. Após semanas de hesitação querendo esconder que o país estava quebrado, o presidente do governo, Mariano Rajoy, fez uma desesperada tentativa de retratar o empréstimo de 100 bi para sanear bancos como um triunfo espanhol — sem contrapartidas desonrosas — e recebeu um humilhante desmentido de Bruxelas. Teatro mal feito não faz o menor sucesso de público ou crítica.
Uma pesquisa publicada no "El País" no mesmo dia do pedido de socorro mostrou que 78% dos espanhóis não confiam em Rajoy, e 85% também não fazem fé na oposição. E mais, já sabiam que a Espanha precisaria de um resgate da troika — FMI, Banco Central Europeu (BCE) e União Europeia — e 70% acham que nada disso vai dar certo. Também avisam que detestam a chanceler federal alemã, Angela Merkel (77%). Assim como os gregos, os espanhóis dão sinais de que não confiam em mais ninguém que está no comando do país.
Depois de meses atuando nos bastidores, foi uma trapalhada só a entrada em cena do presidente do governo. Um dos homens-chave para a sobrevivência do euro, Mariano Rajoy sumiu na hora do anúncio do pacote, após ter passado seis meses jurando que não pediria socorro. Teve o péssimo gosto de vazar um SMS que mandara ao seu ministro da Fazenda no meio das duras negociações em Bruxelas: "Aguenta, somos a quarta maior potência da Europa, Espanha não é Uganda", teclou. No dia seguinte, quando reapareceu, não disse a verdade e, tentando aparentar normalidade, era fotografado na Eurocopa, na Polônia, torcendo pela Espanha contra a Inglaterra. A amarga vitória na arena financeira rendeu-lhe parabéns do rei da Espanha, mas a torcida era contra: numa megamanifestação em Madrid, os espanhóis perguntavam por que só os bancos recebem socorro e não os estudantes, os desempregados, os aposentados e os pequenos empresários falidos. Não falou à nação: chamado para detalhar o pacote no Congresso, disse que ia, mas desistiu. Agora, contou que vai só no fim do mês.
É o estilo Rajoy: os americanos chamam de flip-flop, nós de metamorfose ambulante. Ou vacilão. Seus aliados dizem que ele é uma espécie de motor a diesel, de combustão lenta mas confiável. Vai mais devagar, mas dura mais e consome menos. Já os opositores transformaram em lenda urbana a sua dificuldade de tomar decisões, sua capacidade de sumir na hora em que o país precisa de liderança. Um jornalista comparou-o à sua réplica de cera no museu de Madri: "A estátua se comporta como o original: não responde, está lá parecendo não estar e o rosto nunca muda".
Economistas espanhóis e europeus dizem que Rajoy enviou mensagens contraditórias sobre a saúde da economia da Espanha e assistiu, paralisado, à corrida aos bancos e à fuga dos investidores em busca de um lugar mais seguro para o dinheiro.
"Fez as coisas da pior maneira possível", disse o presidente do BCE, Mario Draghi, aos membros do Parlamento Europeu. Com Rajoy ou sem ele, a Espanha precisaria de socorro, e este é apenas o seu primeiro ato no cenário mundial para evitar a quebra em série dos bancos. Mas o desapontamento dos espanhóis com o chefe do governo veio muito rápido.
Irritados com os socialistas, os eleitores levaram Rajoy ao poder em novembro com forte votação e deram a seu partido — o conservador PP (Partido Popular) — a maior bancada da História. Na noite da vitória declarou que a Espanha deixaria de ser um problema para a zona do euro e anunciou imediatamente uma reforma trabalhista, para lá de necessária num país já com 24% de desempregados. Só esqueceu o microfone aberto e vazou seu comentário de que se preparava para enfrentar uma greve geral — que, evidentemente, veio logo depois. Recentemente, defendeu que os países abrissem mão de parte da soberania para uma autoridade fiscal europeia, embora três meses antes tivesse se recusado a fazer cortes mais profundos no Orçamento visando a preservar a independência da Espanha. Apesar de ter uma longa trajetória no Partido Popular, não está acostumado a atuar sob os holofotes. Foi manobrando nos bastidores do partido que Rajoy chegou à elite política espanhola, percurso que talvez não o tenha preparado para assumir a liderança do país num momento difícil, só comparável à transição do franquismo para a democracia nos anos 70. Já existe uma hashtag #hate Rajoy
Para inglês ver
Os ingleses vêm tentando derrubar regulamentações ambientais da União Europeia, enquanto em Londres o governo se vende como o mais verde da História. São pequenos truques: tirar o urgente de um documento, trocar o obrigatório pelo voluntário em outro. O mais feio foi tentar evitar a fixação de metas para a mudança da matriz energética na Europa. Já está acertado que 20% da energia terão de vir de fontes alternativas até 2020. O ministro inglês queria tira trocar os 20% pelo vago "um significativo aumento na participação de outras fontes", mostraram documentos conseguidos pelo jornal "Guardian" com base na lei da liberdade de informação. O lobby é apoiado pelas seis maiores empresas de energia do Reino Unido.
Sinal dos tempos
Os americanos, quem diria, estão ensinando os franceses a comer. Ou pior, os reis do fast-food estão dando receita para emagrecer os parisienses. A nova-iorquina Jenny Craig, uma sofisticada empresa de alimentação comprada pela Nestlé, já tem quatro mil clientes a quem distribui diariamente congelados com calorias contadas e prontos para entrar no micro-ondas. Só para lembrar: teve uma época em que os restaurantes em Paris se recusavam até a servir Coca-Cola com a comida. É a crise...


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