O Estado de S. Paulo, domingo, 12 de setembro de 2010
China domina mercado de lenço palestino
Roberto Simon - O Estado de S.Paulo
Palestinos e israelenses voltarão a discutir seu futuro na terça-feira, desta vez em Sharm-el-Sheik, na costa do Egito, mas o empresário Yasser Herbawi, morador da Cisjordânia, não parece se preocupar.
Sentado em seu modesto escritório em Hebron, ao lado de um mapa-múndi surrado e uma foto descascada de Yasser Arafat, Herbawi prefere reclamar da mundialização. Ele é dono da última fábrica de keffieh, o icônico lenço palestino, na Cisjordânia. Todos seus concorrentes locais foram vítimas de uma invasão que nada tem a ver com Israel: os keffiehs chineses - de pior qualidade, mas muito mais baratos.
Das décadas de negociação de paz ele diz ter "desistido". Questionado sobre política, desvia o assunto para economia. "É preciso que a vida aqui melhore, que as oportunidades apareçam."
Herbawi explica que hoje, em souks (mercados de rua) na Cisjordânia e Jerusalém, 80% dos lenços que simbolizam a causa palestina são fabricados na China. Há dez anos, todas os keffiehs vinham do território palestino, principalmente de sua fábrica e de outras, em Nablus.
Mas, diante da popularização do adereço em todo mundo, chineses viram um negócio promissor e agora dominam o mercado. Restou a Herbawi, seus três irmãos e seu pai, que fundou a fábrica em 1961, conduzir a resistência (comercial) palestina.
Há duas variações básicas de keffieh: o vermelho, usado pelos jordanianos, e o preto, dos palestinos. O lenço foi inicialmente associado à luta palestina nos anos 30, com a "Revolta Árabe" contra o controle britânico e a imigração de judeus. Foi Arafat, porém, quem imortalizou o keffieh, sempre usando-o preso acima da testa, em contraste com sua farda verde-oliva.
A maior parte da produção da Herbawi Textiles, nome da fábrica de Hebron, fica na Cisjordânia. Mas alguns keffiehs são exportados para países árabes, Europa e EUA. Herbawi diz que sua aposta para vencer os chineses é a qualidade. Seus keffiehs, garante, são 100% algodão, diferentemente "dos outros por aí".
Há dez anos ele teve de fechar a fábrica por causa da segunda intifada. Os confrontos em Hebron espantaram os turistas e seus empregados não conseguiam chegar na fábrica.
Hoje, as coisas estão melhores, afirma o empresário. A não ser pela concorrência chinesa.