19 de febrero de 2018

Abadias beneditinas: modelos de governo monárquico-aristocráticos-democráticos

Abadias beneditinas: modelos de governo monárquico-aristocráticos-democráticos


Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de
política internacional,
sócio do IPCO,
webmaster de
diversos blogs






Continuação do post anterior: Desenvolvimento medieval guiado pela sabedoria monacal




Foi na sala do capítulo, durante as reuniões quotidianas, que nasceram alguns modelos de participação política e de organização do poder ainda em vigor.

O capítulo monástico foi, sem dúvida, o primeiro lugar do Ocidente em que regularmente, diariamente, se verificou a relação dos membros com a Regra, se controlou a respectiva aplicação, se inculcou o seu conteúdo, se reforçou a coesão do grupo.

Porque a vida dos religiosos decorre num regime de direito. Léo Moulin provou, em numerosos estudos, de que forma o estudo das regras e das constituições dos estabelecimentos religiosos é fundamental para a ciência política contemporânea, sublinhando alguns aspectos:

– o carácter misto do governo dos religiosos (monarquia, oligarquia e democracia); isto pelo papel respectivamente confiado ao abade, aos decanos do mosteiro e a toda a comunidade;

– a natureza e a originalidade da sua assembleia legislativa;

– a primazia do poder executivo,primazia essa temperada pela necessidade de esse poder executivo se inclinar perante votos colegiais;

– as origens religiosas das técnicas eleitorais modernas;

– o sistema, complexo e sofisticado, que presidia à eleição do abade (com a participação da “sanior et major pars”), etc.

Lembremos apenas isto: Cister funda a sua Assembleia Supranacional em 1115, habilitando-a a legislar, a modificar ou abrogar as leis, a interpretá-las.






Só o capítulo geral da Ordem, o Parliamentum, pode conceder dispensas e absolvições; esse capítulo elege o superior geral e os seus assistentes; pode destituí-los.

A Assembleia é a fonte de todos os poderes, a Summa Potestas. Isto, repito, em 1115, um século antes da Magna Carta e do seu embrião de regime parlamentar.

Realizações materiais eram consequência da vida religiosa.
Monges rezam em enterro, Huntington Catalog Images, f 192
Comparadas com esta forma elaborada de governo, com estas assembleias regulares submetidas a um código eleitoral e deliberativo extraordinariamente minucioso, as instituições municipais e reais do princípio do século XII parecem bastante toscas.

Tudo o que temos vindo a dizer foi lapidarmente resumido por Taine:

“Pelo seu trabalho inteligente, voluntário, executado em consciência e conduzido a pensar no futuro, o monge produz mais do que o leigo. Pelo seu regime, sóbrio, concentrado, económico, o monge consome menos do que o leigo. É por isso que, aí onde o leigo tinha falhado, ele prospera.”





(Autor: (excertos de) Luís Miguel Duarte, Professor Catedrático de História Medieval na Faculdade de Letras da Universidade do Porto)


FIM

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