18 de junio de 2018

A conversão de Afonso Ratisbonne

A conversão de Afonso Ratisbonne

Armando Santos


Afonso Ratisbonne era um jovem judeu, de uma família de banqueiros estabelecidos em Estrasburgo, com grande projeção social pelas riquezas e pelo parentesco com os famosos Rothschild.
O irmão mais velho de Afonso, Teodoro, em 1827 converteu-se ao catolicismo e se ordenou sacerdote, rompendo, em consequência, com a família. As esperanças desta se concentraram, então, no jovem Afonso, nascido em 1814.
Este, inteligente e bem educado, já havia concluído o curso de Direito e estava noivo de uma jovem judia, sua sobrinha. Tinha 27 anos e, antes de casar, quis fazer uma viagem de férias pela Itália e pelo Oriente. Quando retornasse, casaria e assumiria seu posto na empresa bancária da família.
Deus, porém, o esperava na Itália, mais precisamente em Roma...
Afonso era judeu de religião, embora não praticante. Nutria pela Igreja Católica entranhado ódio, sobretudo pelo ressentimento que toda sua família conservava pela defecção do primogênito. Afonso dizia que não pretendia mudar de religião, mas que se um dia viesse a mudar, far-se-ia protestante, jamais católico.
Em Roma, Ratisbonne esteve algum tempo como turista, visitando obras de arte; visitou também, por mera curiosidade cultural, algumas igrejas católicas, o que ainda mais o consolidou no seu anticatolicismo.
Em Roma, Ratisbonne visitou um antigo colega seu, de nome Gustavo de Bussières, com o qual mantinha estreita amizade. Gustavo era protestante e diversas vezes tentara, em vão, convencer Afonso de suas convicções religiosas. Na casa de Gustavo, Afonso foi apresentado ao irmão deste, Barão Teodoro de Bussières, que havia pouco tempo se convertera ao catolicismo e que era, por sua vez, amigo íntimo do Pe. Teodoro Ratisbonne. Essas duas circunstâncias o tornavam extremamente antipático aos olhos de Afonso.
Só na véspera de sua partida este se resolveu a cumprir um dever social que lhe era penoso: foi deixar um cartão de visitas na casa do Barão, como despedida.

Desejando evitar um encontro, Afonso pretendia deixar discretamente o cartão e partir sem mais. O criado italiano do Barão, porém, não entendeu seu francês e o fez entrar no salão, indo chamar o dono da casa.
Este foi cumprimentar o jovem judeu e logo com ele estabeleceu relações cordiais, procurando atraí-lo para a Fé católica. Conseguiu, não sem insistência, que Afonso adiasse sua partida de Roma para poder assistir a uma cerimônia na Basílica de São Pedro. Conseguiu, também por meio de uma insistência que, se não fosse notoriamente inspirada pela graça, dir-se-ia indiscreta, que Ratisbonne aceitasse uma Medalha Milagrosa e prometesse copiar uma oração muito bonita a Nossa Senhora: o Lembrai-Vos...

O judeu não cabia em si de raiva pelo atrevimento do Barão em lhe fazer essas propostas, mas resolveu tomar tudo com bonomia, esperando, como mais tarde declarou, escrever um livro com seu relato de viagem; nesse livro, o Barão seria um personagem excêntrico, e nada mais.
A 18 de janeiro, faleceu em Roma um amigo íntimo do Barão de Bussières, o Conde de La Ferronays, antigo embaixador da França junto à Santa Sé e homem de grande virtude e piedade. Na véspera de sua morte repentina, La Ferronays conversara com Bussières sobre Ratisbonne e rezara cem vezes a oração Lembrai-Vos, por sua conversão, a pedido de Bussières. É possível que tenha chegado a oferecer sua vida a Deus pela conversão do jovem banqueiro.

No dia 20, por volta do meio dia, o Barão de Bussières foi à Igreja de Sant'Andrea delle Fratte para tratar das solenes exéquias do falecido, que seriam realizadas no dia seguinte. Acompanhava-o Ratisbonne de mau humor, fazendo críticas violentas contra a Igreja e zombando das coisas católicas. Quando chegaram à igreja, o Barão pediu licença por alguns minutos e entrou na sacristia, para tratar do assunto que o levara até ali, e Afonso se pôs a percorrer uma das naves laterais, impedido de passar para o outro lado da igreja, pelos preparativos que estavam sendo feitos para as exéquias do Conde na nave central.
Quando, minutos depois, o Barão retornou em busca de Afonso, não o encontrou onde o havia deixado. Após muito procurar, foi dar com ele no outro lado da igreja, ajoelhado junto a um altar e soluçando. Ali já não estava um judeu, mas estava um convertido que ardentemente desejava o Batismo.
O que se passou nesses minutos, o próprio Ratisbonne narrou:
“Eu estava havia pouco na igreja, quando, de repente, senti-me dominado por uma inquietação inexplicável. Levantei os olhos; todo o edifício havia desaparecido à minha vista; uma só capela tinha, por assim dizer, concentrado toda a luz, e, no meio desse esplendor, apareceu, de pé, sobre o altar, grandiosa, brilhante, cheia de majestade e de doçura, a Virgem Maria, tal como está na minha Medalha; uma força irresistível atraiu-me para Ela. A Virgem fez-me sinal com a mão para que eu me ajoelhasse e pareceu-me dizer: muito bem! Ela não me disse nada, mas eu compreendi tudo”.
Ratisbonne não soube explicar como, estando antes da aparição numa das naves laterais da igreja, foi aparecer na outra, já que estava obstruída a passagem pela nave central. Mas, diante da magnitude do milagre de sua conversão, esse era apenas um pormenor.
A notícia da conversão inesperada, fulminante e completa, imediatamente se propagou, causando grande comoção em toda a Europa.
O Papa Gregório XVI quis conhecer o jovem convertido e recebeu-o paternalmente. Ordenou um inquérito minucioso, dentro do maior rigor exigido pelas normas canônicas. A conclusão foi de que realmente se tratou de um autêntico milagre.
Batizado com o nome de Afonso Maria, Ratisbonne quis entrar na Companhia de Jesus, sendo ordenado sacerdote em 1847. Depois de algum tempo, por recomendação do Papa Beato Pio IX, deixou a Companhia de Jesus e foi unir-se a seu irmão Teodoro, com ele fundando a Congregação dos Missionários de Nossa Senhora de Sion, dedicada à conversão dos judeus.

O Pe. Teodoro difundiu sua Congregação pela França e pela Inglaterra. O Pe. Afonso Maria foi para a Terra Santa, e comprou em Jerusalém um terreno em que outrora estivera o Pretório de Pilatos, ali estabelecendo uma casa da Congregação. Os dois irmãos faleceram no ano de 1884, ambos com fama de excepcionais virtudes.



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