13 de diciembre de 2013

O imperador republicano. E o republicano monarquista

COLUNA

Na História do Brasil, fatos e personagens reais frequentemente superam a capacidade criativa da melhor literatura de ficção. Um exemplo é o do imperador Pedro II e de Deodoro Fonseca


NOTA DEL BLOG. Esta coluna nos hace recordar la sentencia de Cicerón de que “La Historia es la maestra de la vida”, sobre todo cuando los paralelismos los ve hasta un ciego. Nada como escarmentar en cabeza ajena, pero no olvidemos la sentencia de Tayllerand: "Nada aprendieron, nada olvidaron", así estamos.
Na História do Brasil, fatos e personagens reais frequentemente superam a capacidade criativa da melhor literatura de ficção. Um exemplo são os dois principais protagonistas da Proclamação da República, um dos eventos mais cruciais da história brasileira.
Cartas e documentos da época, sugerem que, embora tenha ocupado o trono brasileiro por 49 anos, ou seja, quase meio século, o imperador Pedro II tinha uma alma republicana. Seu adversário, o marechal alagoano Deodoro da Fonseca, ao contrário, tinha fortes convicções monarquistas, embora passasse para a história como o fundador oficial da república brasileira.
Aparentemente, Deodoro da Fonseca derrubou a monarquia mais por ressentimentos pessoais do que por convicções ideológicas. Pelo menos é isso que indica a correspondência que ele trocou um ano antes com o sobrinho Clodoaldo Fonseca, aluno da Escola Militar de Porto Alegre.
Integrante da chamada “mocidade militar” liderada por Benjamin Constant e ardoroso defensor da república, Clodoaldo escreveu uma carta ao tio em meados de 1888 na qual expressava suas ideias. Deodoro reagiu contrariado. “República no Brasil é coisa impossível porque será uma verdadeira desgraça”, respondeu o marechal. “Os brasileiros estão e estarão muito mal educados para republicanos. O único sustentáculo do nosso Brasil é a monarquia. Se mal com ela, pior sem ela”.
Em outra carta, pouco depois, o marechal recomendou ao sobrinho: “Não te metas em questões republicanas, porque República no Brasil e desgraça completa é a mesma coisa; os brasileiros nunca se prepararão para isso, porque sempre lhes faltarão educação e respeito”.
Essas cartas demonstram que, até as vésperas do golpe contra o império, em Quinze de novembro de 1889, o fundador da República não era republicano.
Curiosamente, o outro protagonista desse grande acontecimento histórico, o imperador Pedro II, manifestava convicções ideológicas ainda hoje intrigantes e desafiadoras para seus biógrafos.
Em junho de 1891, já no exilio, o imperador anotou à margem de um livro que estava lendo: “Desejaria que a civilização do Brasil já admitisse o sistema republicano que, para mim, é o mais perfeito, como podem sê-lo as coisas humanas. Creiam que eu só desejava contribuir para um estado social em que a república pudesse ser ‘plantada’ por mim e dar sazonados frutos.”
Ao escritor, poeta e historiador português Alexandre Herculano, que recusara uma honraria do império alegando convicções republicanas, afirmou: “Também não sou partidário em absoluto de nenhum sistema de governo”, acrescentando que, para o Brasil, a melhor alternativa seria uma república com presidente hereditário.
“Difícil é a posição de um monarca nesta época de transição”, escreveu à Condessa de Barral, o grande amor de sua vida, dizendo-se desconfortável na posição de imperador. Se dependesse de sua vontade, preferia ser apenas um presidente da República temporário: “Eu de certo modo poderia ser melhor e mais feliz presidente da República do que imperador constitucional.”
Todos esses documentos sugerem que, na manhã de Quinze de Novembro de 1889, Deodoro da Fonseca e Pedro II percorriam caminhos de sinais trocados. Um fez a república, embora preferisse a monarquia. O outro perdeu um trono que, a rigor, já julgava perdido por achar que a república era inevitável.
Escritor e jornalista, autor da trilogia 18081822 e 1889, sobre a História do Brasil no Século 19.

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