7 de abril de 2013

Entre o risco da abdicação e a mudança de sistema


O Globo, quinta-feira, 4 de abril de 2013

Entre o risco da abdicação e a mudança de sistema

Priscila Guilayn

O indiciamento da princesa Cristina, filha do rei Juan Carlos I e sétima na linha de sucessão da Coroa espanhola, chegou apenas dois dias depois de que, na Câmara dos Deputados, todos os partidos, com a exceção do majoritário Partido Popular, exigissem explicações da Casa Real sobre a herança de € 2,25 milhões, depositados em contas na Suíça, que o monarca teria recebido, há 20 anos, de seu pai, revelada no domingo pelo jornal El Mundo — até então, acreditava-se que ele tinha morrido pobre. A denúncia e o indiciamento da princesa podem ter conseqüências ainda imprevisíveis, segundo os especialistas. Alguns afirmam que o crescente descrédito da Coroa poderia chegar a deslegitimá-la e muitos acreditam que a abdicação do rei está cada vez mais perto.

Segundo Jorge Alberto Benedicto, professor de Sociologia Política da Uned, a credibilidade da monarquia é fundamental para sua sobrevivência. Ele lembra que no fim dos anos 1980 e início dos 1990 rumores sobre o patrimônio do rei Juan Carlos I, seguidos de escândalos vinculados à figura do monarca, foram ocultados. — Mas, quando uma instituição começa a se deteriorar, as críticas afloram, unindo-se umas às outras e criando uma bola de neve. É o que está acontecendo agora.

Especialistas concordam que este descrédito não levaria, pelo menos a médio prazo, a extremos como a mudança do sistema, de monarquia para república, porque os dois principais partidos não parecem ter intenção de entrar no debate. Xavier Arbos, professor de Direito Constitucional da Universidade de Barcelona, ressalta que é muito diferente ter uma república erguida por republicanos e de construí-la como resultado de uma monarquia que naufragou.

Mas a cogitação da abdicação é inevitável. Há dez dias, por exemplo, vazou a notícia de que a televisão pública espanhola já tinha, inclusive, um programa especial preparado sobre a entrega do trono ao príncipe Felipe.

— Depois de uma notícia como a do indiciamento da princesa, a abdicação poderia parecer um reconhecimento, mesmo que indireto, de uma certa culpa ou responsabilidade. Mostraria o rei “derrotado”. Isso revela a incapacidade da Casa Real de prever o ritmo deste processo: deveriam ter escolhido um momento oportuno, para que a abdicação do rei pudesse desvincular-se de escândalos — diz Arbos. — Por isso, acredito que não tomarão esta decisão agora. Mas a pressão aumentará.
Enquanto isso, espera-se alguma atitude da Casa Real, que há mais de um ano excluiu Urdangarin da agenda oficial por seu comportamento “não exemplar”, afastando, também, a princesa Cristina das atividades públicas.

Esta falta de transparência nas finanças reais pode ser um dos elementos causadores do que o historiador Xavier Casals chama de “final da era juancarlista”, que não significa o fim da monarquia, e sim, segundo o autor de Franco e os Borbón, o fim de uma maneira de reinar:

— O declínio da monarquia espanhola foi obra dos próprios membros da Casa Real. Não houve uma ação republicana ou uma ação anti-establishment dirigida contra a Coroa. O que houve foi um fenômeno paradoxal: a imagem pública da família real entrou em contradição com sua imagem privada. É o desgaste do sistema político que nasceu com a era juancarlista e o fim de um ciclo político iniciado com a transição em 1975.

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